Foram três semanas de tensão entre empresários, associações setoriais e o governo, desde que o presidente americano Donald Trump anunciou, em 9 de julho, que as exportações brasileiras seriam taxadas em 50% - o que praticamente inviabilizaria a venda de boa parte dos produtos nacionais. Foi um período de conversas, negociações, lobbies, promessas, tudo na tentativa de amenizar o máximo possível os efeitos da taxação para os negócios no Brasil. Nesta quarta-feira, 30, veio o anúncio oficial do governo americano, que gerou um misto de alívio entre os setores que ficaram de fora e de muita apreensão entre os que não conseguiram escapar.
É uma longa lista de exceções - são 694 itens. Entre eles estão alguns produtos importantes na lista de exportações brasileira, como o suco de laranja, a celulose e aviões da Embraer. Por outro lado, alguns produtos de peso na balança, como café, carnes e frutas passarão a ter uma alíquota extra de 40% - que se soma à de 10% atualmente em vigor, chegando à taxa de 50%. A medida entrará em vigor dentro de sete dias.
Uma estimativa preliminar da Leme Consultores avalia que as exceções ao tarifaço atingem mais de 40% das exportações brasileiras para os EUA. De janeiro a junho deste ano, o Brasil exportou US$ 20 bilhões para os Estados Unidos. Desse total, US$ 8,2 bilhões (41%) são de produtos que figuram na lista de exceções de Trump, enquanto US$ 11,81 bilhões são produtos que foram atingidos (59%).
Mesmo com as exceções, o impacto das tarifas de Trump para o Brasil será “muito grande”, segundo o ex-secretário de Comércio Exterior Welber Barral. “Uma taxa de 50% é muito alta mesmo. A situação do Brasil é bem pior do que a da Europa e a do Japão, por exemplo, que foram taxados em 15%. Vai afetar muito o País, inclusive produtos em que o Brasil compete com outros, como a carne.”
Segundo o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, uma avaliação preliminar da medida, feita logo após a divulgação, indicava que o cenário de impacto com o tarifaço dos EUA não era “o pior possível”. “Parece que, do ponto de vista de efeito econômico, é menor que o cenário anterior”, afirmou, reforçando que não poderia reagir precipitadamente sem antes conhecer em detalhes a medida, incluindo as exceções no tarifaço aplicado pelos EUA. “O cenário do tarifaço não sendo o pior não quer dizer que não há impactos.”
Os setores que ficaram de fora, claro, comemoraram. Entre eles, os exportadores de suco de laranja. O diretor executivo da associação CitrusBR, que abriga as grandes empresas do setor, Ibiapaba Netto, disse ter recebido a notícia “com alívio e responsabilidade”.
Porém, mesmo desidratado em relação ao que se esperava, ainda assim a taxação é extremamente alta para muitos setores, o que deve provocar problemas graves em muitas empresas, provavelmente até com fechamentos de unidades e demissões.
José Velloso, presidente executivo da Associação Brasileira de Máqunas (Abimaq), observou que o setor não foi contemplado na lista de exceções. A visão dele é de que Trump beneficiou apenas produtos que terão impacto sobre a economia americana e, no caso das máquinas, o Brasil é visto como um concorrente. Ele disse, contudo, que houve pelo menos a boa notícia de que os produtos já em trânsito para os EUA não serão tarifados.
Com esse cenário colocado, logo após o anúncio, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reuniu com um grupo de ministros para discutir os próximos passos. Entre os presentes, os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, da Advocacia-Geral da União, Jorge Messias, da Secretaria de Comunicação Social, Sidônio Palmeira, da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, além do vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin.
Tom político
O texto da ordem executiva assinada por Trump (leia a íntegra aqui) para justificar a taxação ao Brasil trouxe um tom muito mais político do que econômico. Ataca o governo brasileiro e o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e faz uma defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro e de “milhares de seus apoiadores” como alvos de “violações dos direitos humanos que minaram o Estado de Direito no Brasil”.
No texto, a Casa Branca informa: “Hoje, o presidente Donald J. Trump assinou uma Ordem Executiva implementando uma tarifa adicional de 40% sobre o Brasil, elevando o valor total da tarifa para 50%, para lidar com políticas, práticas e ações recentes do governo brasileiro que constituem uma ameaça incomum e extraordinária à segurança nacional, à política externa e à economia dos Estados Unidos”.
A ordem declara uma nova emergência nacional, “utilizando a autoridade do presidente sob a Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional de 1977 (IEEPA) e estabelece uma tarifa adicional de 40% para lidar com as políticas e ações incomuns e extraordinárias do governo do Brasil que prejudicam empresas americanas, os direitos de liberdade de expressão de cidadãos americanos, a política externa dos EUA e a economia dos EUA”.
Esse tom político permeou todas as discussões em torno do tarifaço, desde o início. Quando anunciou a taxação, em 9 de julho, Trump justificou a medida dizendo que havia uma “caça às bruxas no Brasil”, referindo-se ao julgamento de Jair Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal. A questão econômica ficou em segundo plano nessas discussões, até porque os Estados Unidos são superavitários há muitos anos na relação comercial com o Brasil.
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